Não procurem lógica neste Europeu. Procurem ironias.
De repente, Griezmann parecia que estava no habitat de Madrid. Muitos metros para correr na frente, um latifúndio que crescia no decorrer do jogo com o resto da equipa bem longe, atrás da linha bola. A França de Deschamps confirmou o desmontar o triângulo musculado do meio-campo para o entregar ao duplo-pivot Matuidi-Pogba (4x2x3x1, com Sissoko-Payet nas alas) mas não é um sistema que diz como a equipa joga.
Reconhecendo o poder da máquina alemã, baixou o bloco e fez, nesse posicionamento, a sua exibição estrategicamente mais defensiva deste Euro. Não definiu uma zona de pressão e, intencionalmente, tentou ganhar o jogo jogando-o essencialmente no momento defensivo (em organização, não em pressão, tirando a feita pelos dois avançados Giroud-Griezmann à saída de bola germânica). Depois, tentava os ataques rápidos. Por tudo isto, a sensação táctica de ver Griezmann numa “França estilo At.Madrid”.
Foi uma estratégia para uma noite só. O bloco vai, naturalmente, voltar a subir na Final com Portugal. Esta opção de Deschamps reflete, com nitidez, como o “futebol de estratégia” manda neste Europeu por cima da identidade como principio de afirmação.
A Alemanha montou o jogo a pensar em si própria, retirando Kroos da pressão inicial adversária (como sucedera contra a Itália) puxando-o para interior-esquerdo, local onde recuava para pegar na bola e iniciar a construção de jogo (ficando Schweinsteiger atrás e subindo Can).
Com isso, a equipa pegou na bola, circulou, dominou, entrou nos últimos 30 metros, fez subir bem abertos e profundos os laterais Kimmich-Hector, deu as diagonais a Ozil e Draxler e soltou Muller como “verdadeiro 9”. A “máquina” movia-se com personalidade. Andava perto da baliza, mas o muro francês foi resistindo e mesmo que na altura que a bola vinha ter consigo, a tentação mais do lançar logo o contra-ataque era mais para respirar um pouco baixando o ritmo.
Com o passar do tempo, a “máquina” começou a repetir demasiado os mesmos movimentos até começar a cometer erros. Em dois momentos, apontou uma “pistola á cabeça” e ofereceu dois golos ao plano de contenção francês. Não procurem lógica neste Europeu. Procurem ironias.
A máquina é humana
A queda do império alemão parece uma história de traição interna. O penalty, por fazer um corte com a mão de Schweinsteiger (como Boateng já fizera contra a Itália) quando dominava o jogo e o erro de Neuer a dar uma palmada na bola para a frente (para Griezmann só encostar , após os defesa trocarem a bola na área como estivessem sozinhos em campo).
É como se, de repente, toda aquela “máquina de futebol” tivesse um “bug de programação” e deixa-se de funcionar. Torna-se difícil entender como jogadores destes, claramente por cima do jogo e superior aos adversários, quase se atiram de um precipício quando parecia mandarem em tudo em campo.
Não sei se são momentos de ansiedade. Não tem explicação táctica. Existiu, claro, a estratégia francesa, que soube baixar o bloco com veneno e a segurança defensiva da sua organização, mas, para além da autoderrota alemã naqueles dois lances, a maior explicação táctica que me salta tem a ver com a falta do seu ponta-de-lança clássico. A lesão de Mário Gomez condicionou a melhor expressão de movimentação interligada do ataque alemão que com o passar do tempo foi descodificado pelas marcações franceses, tornando-se denunciado. Afinal, a máquina é humana.