Champion 20/21 (Bloco de notas II): Promessas com estilo

14 de Novembro de 2020




Desde De Ketelaere a Rodrygo, passando por Gravenberch. O futuro com arte.

Uma aparição no palco da Champions que projeta o melhor futuro do futebol belga. O Brugge choca com naturais limitações competitivas na superior exigência internacional mas, no seu onze-base, vê-se que existem princípios de jogo positivos na relação com o jogo (e não só tecnicamente com a bola). É dessa forma que vejo surgir, aos 19 anos, o talento de Charles De Ketelaere, feito nas escolas de Brugge e já indiscutível na primeira equipa. Espécie de segundo-avançado, ala solto para diagonais, ou até nº9 mesmo, tem um agilidade de controlo de bola a sair de espaços curtos com visão periférica de rotação e passe. Junta-lhe, no jogo, também o sentido de definição e finalização. Um gigante (1.92m) com relação perfeita com a bola na relva. Em vez de se impor pelo que a natureza física lhe deu, impõe-se pelo que a qualidade técnica lhe permite fazer de diferenciador. Quando a bola está lá em baixo, todos temos a mesma altura. É o perfume belga De Ketelaere, craque em formação mas já com os fundamentos de jogo todos na cabeça.

Eik ten Hag continua a treinar o... estilo de jogo do Ajax. É diferente do que só ser treinador do Ajax. É ser treinador dum estilo de jogo respeitando uma escola, embora (como na saga de 18/19) saiba onde adaptar a ideia-base á da chamada “intensidade de jogo moderna”. Não se trata, no entanto, como outrora em Amsterdão, duma equipa de formação. É uma equipa que mescla diferentes vias: “scouting” de promessas, como Kudus, craques reinventados, como Tadic, talentos vindos de outras paragens, como o brasileiro-extremo Antony, até ao berço da formação, como Gravenberch.

Em 4x3x3, com a maturidade de Blind a surgir como nº6, tem no nº8 (camisola e posição) Gravenberch, 18 anos (da geração-2002!) a pegar no melhor futebol de controlo de bola, passe, jogo apoiado e progressão (circulando ou verticalizando o passe).  Vejo-o o jogar e pergunto-me: mas aquilo já nasceu com ele? Claro que não. Ou melhor, o entorno e o estilo de jogar é que o “abraçou” desde o inicio que quis dar pontapés num bola e entrar, com essa técnica, num jogo futebol colectivo que já tinha um escola para o receber e formar. É assim que se forma um estilo de jogo (e se dá perfil aos jogadores de elite dum país)

É sedutor ver o FC Midtjylland nos grupos da Champions. Trata-se do campeão dinamarquês que representa muitos clubes da Liga da Dinamarca, como o Nordsjaelland, que é, neste momento, dos campeonatos com melhores projetos de formação/prospecção de talentos/promessa (muitos vindos da África do futuro). Em 4x2x3x1, tem uma duplo-pivot Onyeka-Cajuste que conduz muito bem a saída de bola. Uma aliança nigeriana-sueca que combina diferentes estilos com igual rigor táctico e execução técnica objectiva de jogo (e não só no gesto de tratar bem a bola). Brian Priske, o treinador, mesmo sabendo que num cenário de Champions o onze poderia sentir a insustentável leveza do seu ser competitivo a este nível mas alto, não cedeu no seu estilo de jogo. Este Midtjylland tem, ainda, extremos com velho perfume dessa espécie em extinção (Dreyer e Mabil, que passou pelo Paços). Vale a pena ver a Liga da Dinamarca só para descobrir tantos talentos a nascer (e tentar adivinhar o que, se evoluírem com esse potencial, serão no futuro).

Uma nota para um “menino da vila” que surge como solução entre o “mundo de estrelas” do Real Madrid. Rodrygo Goes. É fascinante ver como, aos 19 anos, baixote e com um “jogo moleque” se torna, na hora do remate, objectivamente adulto, sem tremer, com tanto com samba e golo. Resolveu, assim, o jogo com Inter (3-2) e, no passe, teve outro garoto, Vinícius (que fez só agora 20 mas já de tanto ouvirmos falar dele, até julgamos ter mais). Depois disto, é tempo de parar com o mito dos “jogadores experientes” para estes jogos e como solução para os momentos mais difíceis. O segredo está na rua. A liberdade está a passar por aqui.