É um Europeu difícil de definir. Não existe uma linha condutora clara de estilo de jogo, nem equipas que o marquem pela sua identidade para o futuro. Chegamos às meias-finais e quase parece que são quase como dois Europeus diferentes que se disputam em diferentes Estádios para depois se cruzarem na Final. De um lado, a “chave dos monstros” (de onde já caiu Espanha, Itália, Inglaterra..) e onde vão defrontar-se França e Alemanha. E do outro, a “chave dos sonhadores”, as potências da segunda linha (de onde já caiu Bélgica, Polónia, Croácia...) onde Portugal emerge agora como a principal força frente ao “conto de fadas” de Gales.
No passado, as nossas seleções já disputaram outras meias-finais, mas esta é uma oportunidade “impensável” antes do torneio de poder chegar à Final sem defrontar no caminho nenhum gigante. Nunca tal sucedera a nenhum outro Finalista dito sonhador noutro Europeu. Até a Grécia do pesadelo de 2004 eliminara a França de Zidane.
Apesar de todo o lado combativo com que se possa elogiar do futebol galês, não consigo em nenhum ponto vislumbrar que seja, em potencial, mais equipa (sobretudo sem Ramsey) que Portugal. Poderá ser na questão da “unidade competitiva” que forma mas neste ponto não acredito nesse factor como decisivo.
Não será, no entanto, o jogo para Portugal tentar criar uma ideia diferente em relação ao seu futebol que se construiu ao longo deste Euro pela comunidade futebolística internacional. É um jogo para voltarmos a jogar de sobrolho carregado sem tentações do “sexy football” como um dia lhe chamou Gullit.
Esta seleção cresceu com bases muito diferentes do passado porque também se deparou com problemas de construção (da mudança de dogma táctico –de 4x3x3 para 4x4x2- à dificuldade de encaixar nela as características de muitos jogadores) como antes não tivera. Por maior que seja Ronaldo, este é o Euro do imperial Pepe a planar sobre tudo na defesa e das “rastas rotativas” de Renato Sanches, novo protótipo do médio português do futuro. São imagens diferentes do passado, mas são aquelas que o nosso futebol, estilo de jogo, ideias e circunstâncias, produziu nesta fase de renovação ou reinvenção. Podemos ser heróis por um dia.
O novo “jogador de elite”
Ao longo do Euro, debateram-se quase todas as posições dentro do onze da seleção. Não faz sentido tantas dúvidas numa fase final, mas a forma como desde o inicio do seu legado Fernando Santos quis reabrir a seleção então algo “fechada sobre si própria”, alargando até para além das fronteiras do evidente “jogador de elite” a observação dos potenciais selecionáveis, retirou-lhe a possibilidade de formar o tal núcleo duro forte. A transformação foi, pois, dentro do relvado tacticamente e fora dele na criação de um “novo ciclo” de seleção.
Descobriu-se assim um lateral-esquerdo “escondido” no futebol francês. Rafael Guerreiro. Bastou vir a um jogo particular, aquele na França, para nos treinos Fernando Santos abrir os olhos em relação aquele “baixinho” que voava na faixa. Ter, nesse momento, contado com o apoio dos catedráticos centrais Pepe e Ricardo Carvalho para o proteger no jogo (tacticamente cobrir as costas nas suas subidas) foi decisivo para o poder lançar e a a revelação chegasse a este ponto, de titular da seleção. Ele é o símbolo das novas portas que Fernando Santos criou no edifício da seleção para descobrir futuros “jogadores de elite” na diáspora do nosso futebol.