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06 de Setembro de 2016




A  Alemanha sem ponta-de-lança e a Inglaterra com Rooney a médio-recuado; A “velha” Espanha e a explosão de Dembelé.   

Começou o longo caminho até à Rússia. Como seguindo o seu mais estranho trilho geracional, a Alemanha volta a arrancar sem um nº9 de referência. Na seleção alemã, o “ponta-de-lança” joga a... extremo-direito: Muller. É ele quem aparece sempre a finalizar vindo da faixa direita (sistema 4x2x3x1) metendo-se no meio, onde conseguiram transformar o falso 9 Gotze num jogador que passa agora o jogo todo, sem se queixar, de costas quase sem tocar na bola quando antes era um 10 com bola no pé.

Com a força que tem o duplo-pivot de cobertura e construção Khedira-Kross, o onze aguenta tacticamente com tudo a este nível (ganhou a passear na Noruega) mas é uma limitação enorme de movimentos e sobretudo presença em espaços de área, onde lhe falta uma referência de remate (e diagonais curtas) em jogos mais exigentes. Viu-se a diferença nesse processo atacante no Euro com ou sem Mário Gomez. A verdade é que olhamos todo o futebol alemão (selecção sub-21 inclusive) e não se vê qualquer ponta-de-lança de "top" a nascer. Um enigma.

Sam Allardyce estreou-se no banco da Inglaterra mas a equipa não mexeu um metro táctico em termos de imaginação. Na continuidade dessa linha de pensamento, Rooney continua (dentro do 4x3x3) a jogar muito recuado, quase a 40 metros da baliza por sistema. A seu lado, está Henderson (Dier é o pivot 6) que podia assumir melhor esse lançamento defesa-ataque, mas Allardyce segue a linha de Hodgson e volta a colocar Rooney nesse habitat recuado. É ele quem pede a bola atrás e assume (muitas vezes com lançamentos longos) a ligação-construção com o ataque, raramente se soltando para aparecer desde trás nas costas do ponta-de-lança Kane. No fim, disse que não se importava de jogar nessa posição e Allardyce confessou que lhe deu abertura para que se não se sentisse bem, o assumisse, embora admitindo que tinha jogado recuado demais. Este é um posicionamento tático que se nota mais neste tipo de jogo de ataque continuado inglês, como sucedeu frente á Eslováquia muto fechada (e com dez jogadores, após expulsão de Skrtel, quase toda a segunda parte).

Numa altura em que no Manchester United, Mourinho puxou Rooney para a sua posição natural de segundo-avançado, esta opção posicional na seleção é ainda mais intrigante. Parece que joga com o peso amarrado aos pés todo o jogo.

Alemanha e Inglaterra serão sempre duas grandes potências do futebol mundial. A diferença está na capacidade de uma saber ler os sinais do tempo (e adaptar-se, estilo e táctica) enquanto outra continua numa trincheira do tempo. Poética se ainda se jogasse em terrenos enlameados. Desadequada nos tempos tácticos modernos.

A "velha" Espanha

lopetegui

Para quem tem uma memória mais atormentada da sua passagem por Portugal, no banco do FC Porto, pode parecer algo de profundamente estranho, mas na visão estilística de jogo (e bases que a construíram) a aposta da Espanha em Lopetegui para a sua seleção faz sentido. Não só porque já tem o passado de ter sido (com sucesso) selecionador sub-21, como no tipo de futebol de posse e circulação que defende (por vezes ficando preso na questão que Guardiola levantava de só desenhar o “U” nessa circulação e não o fechar na parte final metendo o jogo e bola por dentro na finalização).

Ou seja, tal como faz o Barcelona, a Federação espanhola mais do que contratar um treinador para treinar a equipa, quer um selecionador7treinador para treinar uma... ideia. E, claro, fazê-la voltar a ganhar. Nas ultimas décadas, de Aragonês a Del Bosque (com Guardiola como inspiração) a Espanha transformou um estilo numa escola. Lopetegui foi aluno e agora terá de ser professor ao mais alto nível. Começou a ganhar na Bélgica, procurando essa ideia de jogo.

O que joga Dembelé    

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Pelo que finta e dança, podia só querer ser um rebelde habilidoso em campo. Mas não. Ousame Dembelé, mais do que saber fintar, quer perceber o jogo. Na forma como se coloca sem bola, procurando o espaço vazio em largura de forma a que a equipa o vejo dando-lhe a linha de passe para o fazer. E, depois, na forma como com ela nos pés, tanto tenta o drible, como a tabela, joga um pouco por dentro, mas sem insistir em diagonais, insistindo mais no passe, em fazer as melhores assistências.

Sei que ele é canhoto mas apenas por uma razão: porque ele o disse. Se não continuava na dúvida tal a forma como define tantas vezes com o pé direito, podendo por isso jogar na faixa direita sem ter a permanente necessidade de trocar o pé e flectir um pouco para cruzar. Tem raízes na Mautitânia, cresceu no Rennes, foi esta época para Dortmund (onde já “partiu tudo” no primeiro jogo) e estreou-se esta semana, aos 19 anos, pela seleção francesa. Pisa o relvado no chamado “território dos extremos” mas no jogo mais do que a faixa, está sempre a ver o campo todo. Por onde quer também que a bola ande.